Chuva no dia de São José é esperança para 9 cidades vítimas da seca em PE.
G1 viajou 1,4 mil km e viu falta de água, criações dizimadas e desemprego.
Se não chover no dia do santo, nesta terça, estiagem será severa, diz crença.
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Açude de Capoeiras. Foto: Luna Markman/G1 |
A crença católica diz que se chover até o Dia de São José, celebrado nesta terça-feira (19), a safra vai ser boa. Quinze cidades pernambucanas que têm o santo como padroeiro estão em situação de emergência por causa da longa estiagem, mas os agricultores aguardam ansiosamente pela chuva, que não cai em bom volume há muito tempo. Os primeiros decretos municipais de calamidade foram reconhecidos pelo Ministério da Integração em março de 2012. A seca atinge 132.750 mil pessoas nesses 15 municípios, segundo a Comissão de Defesa Civil de Pernambuco (Codecipe), a maior parte vivendo nas zonas rurais.
O G1 rodou 1,4 mil quilômetros, cortando nove localidades do Sertão, Agreste e Mata Norte do estado, e acompanhou o sofrimento de vários devotos a São José. Em Capoeiras, a seca afetou 100% da população - são 19 mil habitantes e ninguém mais consegue plantar. Na cidade, 70% do rebanho foi perdido.
Fé x previsão do tempo
Em várias tradições religiosas, trabalhadores da terra desenvolveram mitos, ritos e louvores a deuses e santos para conseguir boas colheitas e, consequentemente, alimento para os animais, como explica o professor de teologia da Universidade Católica de Pernambuco, Artur Peregrino. “Colocado no calendário romano no século 15, o dia 19 de março é de súplica por chuva a São José, na tradição católica", explica. Segundo o estudioso, José, pai de Jesus Cristo, era carpinteiro, mas acredita-se que em épocas de plantio e colheita ele também trabalhava na agricultura. "A gente pode presumir que, por marcar a chegada de um período mais chuvoso, o dia 19 foi simbolicamente escolhido para celebrar o santo, que virou patrono dos agricultores e declarado pelo papa Bento XV como patrono da justiça social", informa o estudioso.
A climatologia explica o porquê dos céus mais cinzentos em março. É neste mês que ocorre o equinócio, marcando o ponto da órbita da Terra em que o dia e a noite têm a mesma duração. É a transição do verão para o outono, no Brasil e, como nos últimos cinco anos, o fenômeno acontecerá nesta quarta-feira (20). "Neste período, espera-se que as chuvas se intensifiquem devido à Zona de Convergência Intertropical estar mais situada ao sul, entre outros fatores", explica o metereologista Vinícius Gomes, da Agência Pernambucana de Águas e Clima (Apac).
Capoeiras: Festa cancelada e 100% da população prejudicada
Por causa dos efeitos da estiagem e da previsão do tempo nada otimista, a Prefeitura de Capoeiras, no Agreste, decidiu cancelar a programação profana da festa de São José. "Os R$ 300 mil que seriam usados para pagar bandas e montar toda a infraestrutura agora servirão para doar cestas básicas e água mineral a pelo menos três mil famílias cadastradas, além da contratação de carros-pipa, recuperação de poços artesianos e limpeza de cacimbas [espécie de poço] de minação", afirma o secretário municipal de Administração, Gildo Marques.
Segundo a Codecipe, a seca afetou 100% da população de Capoeiras, que tem 19 mil habitantes. Ninguém mais consegue plantar e 70% do rebanho foi perdido. A cidade tinha a maior feira de gado do Agreste Meridional. O maior açude da cidade, o Gurjão, que também abastece parte de São Bento do Una e Caetés, está com 21% da capacidade. A água é encanada pela Companhia Pernambucana de Saneamento (Compesa) e chega nas casas da zona urbana a cada 72 horas.
Ao todo, 18 carros-pipa levam água de fontes de Garanhuns para a zona rural de Capoeiras. "Atualmente, há também 22 poços, sendo cinco recentemente recuperados. O governo estadual prometeu perfurar mais cinco e construir quatro barragens de médio porte. Vamos esperar por essa ajuda", informa o secretário. Sem trabalho no campo, agricultores e criadores batalham empregos na cidade. "Só nesses três primeiros meses do ano, cerca de 800 pessoas vieram aqui na prefeitura pedindo trabalho. Conseguimos contratar uns cem", complementa Marques.
Morador do Sítio Mimosos, Jadiel Mariano conseguiu uma vaga na Secretaria Municipal de Educação como entregador de merenda. "Agora, vou ganhar um salário mínimo. Quando muito, estava 'tirando' só R$ 90 por semana nos roçados. Vai dar para fazer a feira, comprar água, mandar dinheiro para minha filha em São Paulo", enumera.
Já Maria Milda Gueiros ainda espera uma chance. No Sítio Cascavel, a 21 km do centro de Capoeiras, ela mantém marido e dois filhos com o leite que vende de dez vacas "magrinhas" e R$ 184 do Bolsa Família. "Vim aqui na Prefeitura topando o que vier, posso varrer rua, qualquer coisa. Estamos vivendo ‘imprensado' demais", comenta.
Desemprego generalizado
Um dos resultados mais evidentes da seca é o aumento do desemprego no campo, que o G1 constatou em várias cidades visitadas, além de Capoeiras.