Por Altamir Pinheiro
Filho de um antigo industrial do cinema italiano, Sergio Leone, ficou conhecido mundialmente por popularizar o gênero do western spaghetti. Foi só em 1964 que estreou como diretor em seu primeiro filme de bang bang, ao realizar o antológico POR UM PUNHADO DE DÓLARES, estrelado pelo novato Clint Eastwood. Foi um dos mais brilhantes cineastas da sua geração e inventor de um estilo em que não faltam lances de pura genialidade. Ele é hoje fonte de inspiração para novos cineastas como Quentin Tarantino e Robert Rodriguez. Seu primeiro faroeste é uma comédia satírica, exuberante e impetuosa sobre a violência em filmes de cowboy sujo e fora da lei.
Em primeira mão o cinéfilo Darci Fonseca nos confidencia que, a imagem do homem solitário vestido com um poncho e com um toco de cigarrrilha no canto da boca em “POR UM PUNHADO DE DÓLARES” criada por Clint Eastwood é tão importante para o cinema, especialmente para o faroeste, quanto a presença de John Wayne/Ringo Kid em “No Tempo das Diligências”. Se em 1939 John Ford com seu filme deu ao gênero sutileza, lirismo e respeito antes jamais imaginados, Sergio Leone 35 anos depois mudou definitivamente a forma de se fazer westerns. O diretor italiano acrescentou ao faroeste, com “Por um Punhado de Dólares”, padrões tão chocantes no realismo sujo e na extremada violência que o gênero nunca mais voltaria a ser o mesmo. o primeiro faroeste de Sergio Leone antecipou, no entanto, o perfeito domínio fílmico que o diretor alcançaria em seus trabalhos posteriores.
Em uma de suas brilhantes explanações, o estudioso em filmes da modalidade faroeste, Antônio Nahud, nos informa que na década de 60, o WESTERN atravessou uma fase de vacas magras nos Estados Unidos, mas na Itália, conhecidos como “spaghetti-westerns”, estavam sendo produzidos a todo vapor, numa abordagem mais contemporânea e operística. O italiano Sergio Leone, mestre exemplar desse estilo, desconstruiu de certa forma o mito ao realizar excitantes tributos, como os inigualáveis Três Homens em Conflito(1966) e Era Uma Vez no Oeste (1968). Com extraordinária trilha sonora do maestro ENNIO MORRICONE, este último resgatou os estilizados personagens do gênero: a prostituta bondosa, o pistoleiro enigmático, o bandido manhoso. Um universo de pistoleiros e bandidos violentamente dominados pelo fascínio do dinheiro fácil e da crueldade sem precedentes.
Uma curiosidade interessante do estudioso e crítico de cinema Paulo Telles aconteceu em 1968, quando Sergio Leone lançou ERA UMA VEZ NO OESTE, com Charles Bronson, Claudia Cardinale, e Henry Fonda (cowboy Hollywoodiano por excelência que já tinha mais de 30 anos de experiência, que aos 63 anos interpreta o único vilão de sua carreira. Leone era fã deste grande e saudoso astro falecido em 1982). Na época do lançamento, foi um fracasso de bilheteria, mas com o passar dos anos, elevou a obra prima do gênero. O mesmo se sucedeu com o clássico norte-americano RASTROS DE ÓDIO, de John Ford, que ao ser lançado em 1956 não teve boa repercussão de crítica e de público, mas foi reconhecido como obra magistral da Sétima Arte tempos depois.
Com a crise dessa modalidade de cinema no Oeste norte-americano houve uma debandada em massa dos atores para o país europeu que, visto no mapa, tem o formato de uma grande bota, Itália. O primeiro da lista foi Clint Eastwood que saiu dos States em direção a Itália para protagonizar a obra triológica que o consagrou definitivamente. Por tabela outros o seguiram como Lee Van Cleef (o mais bem sucedido depois de Clint Eastwood), Richard Boone (da série de TV Paladino do Oeste), Clint Walker (da Série Cheyenne), Burt Reynolds, que como Clint havia começado sua carreira na TV em uma série televisiva, entre outros. Grande parte destes ATORES AMERICANOS seguiram o exemplo de Eastwood e migraram para a “terra prometida” do novo gênero de westerns, muito deles com o objetivo de revitalizarem suas carreiras.
Além dos americanos, o Western europeu contou também com atores de outros países, como a Inglaterra (Stewart Granger); França (Philippe Leroy e Johnny Halliday); Alemanhã (Klaus Kinski); Espanha (Fernando Sancho, um dos bandidos mais feiosos requisitados nos Westerns Europeus); e o BRASIL não estava menos representado sem a presença de ANTHONY STEFFEN, ou melhor, Antonio de Teffé (nascido em 1930, falecido no Rio de Janeiro em 2004), que fez muito sucesso em território europeu. NORMA BENGELL, nossa atriz brasileira, também participou de um Spaghetti Western: Os cruéis em 1966. O filme dirigido por Sergio Corbucci e estrelado pelo veterano Joseph Cotten.
No documentário 100 anos de Western escrito pelo autor Primagio Mantovi, ele nos brinda com ricas informações que pinçando uma aqui outra acolá nos defrontamos com uma boa margem das afinidades de diretores como Leone e Corbucci, surgiram outros diretores do gênero Spaghetti nos faroestes italianos, como Duccio Tessari, que dirigiu Uma Pistola Para Ringo, ou Giorgio Ferroni, com o Dólar Furado, ambos estrelados pelo galã GIULIANO GEMMA (RINGO), outro herói dos faroestes europeus, talvez o menos "sujo" dentre eles. Giuliano Gemma(amigo íntimo do cantor brasileiro Roberto Carlos) perdeu a vida em um trágico acidente de carro, em 2013, nas proximidades de Roma e morreu após dar entrada em um hospital na cidade de Civitavecchia. Na oportunidade ele estava com 75 anos de idade. Se não bastasse Giuliano Gemma, ainda temos FRANCO NERO (hoje com 77 anos), italiano legítimo estrelando Django, de Sergio Corbucci, em 1966, e Nero fez tanto sucesso que foi um dos atores mais requisitados para o gênero spaghetti nos 10 anos seguintes.
Praticamente lançado por Sergio Leone, Clint Eastwood prestou uma homenagem ao gênero que o consagrou, em “Os Imperdoáveis(1992), com Gene Hackman, Morgan Freeman e Richard Harris no elenco, rendendo-lhe o Oscar de Melhor Filme e Direção. O pesquisador Nahud diz categoricamente que, CLINT, em seu último filme de faroeste, voltou ao bang bang com novos olhos, pois não havia mais glamour em matar, o homem da lei se comporta tão mal quanto o renegado que tenta se regenerar. Ele dedicou essa reflexão notável aos seu mentor SERGIO LEONE. Um lamento ou canto triste ao fim do velho Oeste nos filmes por eles retratados.
Finalmente, por ironia do destino há quem diga que o seu melhor filme que não é bang bang e sim de gangster continua sendo ERA UMA VEZ NA AMÉRICA(1984), com Robert De Niro e James Woods e trilha sonora de Ennio Morricone. Não é à toa que, antes, em 1972, ele tinha sido convidado para dirigir o PODEROSO CHEFÃO com Marlon Brando e Al Pacino, porém Sérgio Leone recusou em razão desse seu outro projeto que só veio a realizá-lo em 1984, mas tornou-se, segundo os críticos, na sua melhor obra cinematográfica.