Por Altamir Pinheiro
Há mais de 80 anos estreava nos cinemas do mundo inteiro o clássico de 1936, A Dama das Camélias, protagonizados pelo casal Greta Garbo e Robert Taylor. No auge de sua beleza e talento(aos 31 anos de idade), Greta Garbo interpretaria Marguerite e Robert Taylor(aos 27 anos) personifica o plebeu Armand. A Dama das Camélias é um filme que você vê, revê e não se cansa. Seja pela interpretação do elenco e os cenários bem recriados, a aura do romantismo, os figurinos, como também a exuberante atuação de Garbo ou sua simples presença... O próprio diretor do filme ficou chocado ou pasmo com a leveza do toque dela - a frieza, a perversidade com que interpretava a sua personagem. Na história da cinematografia mundial, Greta Garbo tornou-se um tipo de estrela, daquela que nunca se apaga.
Na versão em preto & branco a estonteante Greta Garbo interpreta uma simples cortesã(Marguerite Gautier), que é uma mulher ambiciosa, fútil, caprichosa, vive num ambiente de colegas a quem chama de seus únicos amigos. Ela vive do dinheiro de homens. Todos se vestem muito bem, o ambiente é de festas, as mulheres não leem e mal sabem escrever. Ao encontrar o amor ela o evita porque é interesseira e pródiga, gasta mais do que pode, tem dívidas e não para de contrair novas. Quando por fim resolve aceitar o amor, condições sociais lhe são imposta de modo que se vê moralmente obrigada a deixá-lo. Então cai em desgraça, fica doente e tudo perde o sentido.
Nesta adaptação do famoso romance de Alexandre Dumas Filho, a radiante GARBO parece que veio de outro planeta. Ela tem uma estranheza que faz com que até os momentos mais exageradamente sentimentais dessa história funcionem. Ela tem um ar enigmático, mas mostra perfeita e sutilmente todas as indecisões e dilemas da personagem. Ela é alma e coração desse grande melodrama ao desempenhar o papel de uma prostituta francesa na Paris do século 19. Se apaixona por um jovem estudante, filho de uma família aristocrática, mas sua má reputação não favorece o affair e ela termina por morrer de tuberculose. O mundo inteiro derramou lágrimas com esse estrondoso sucesso, que valeu para ela mais um prêmio do Círculo de Críticos de Cinema de Nova Iorque, além de ser o seu filme favorito.
Sueca naturalizada norte-americana, possivelmente tudo já foi dito sobre esta estrela de rosto perfeito. Do cinema mudo passou para o falado, sem sofrer qualquer arranhão em sua trajetória, muito pelo contrário, valorizando ainda mais o status de Rainha de Hollywood. O ar andrógino e gélido solidificou a fama, conquistando um lugar único na Sétima Arte. O que fez dela uma figura tão especial – possivelmente o ícone mais duradouro das telas – foi o seu rosto. Insondável e curiosamente duro, prestava-se a todas as leituras, levando-a ao estrelato. Com seu talento e aura de mistério, tornou-se uma das atrizes mais fascinantes de sempre, eleita pelo AMERICAN FILM INSTITUTE (AFI) como a quinta maior lenda da história do cinema.
Mais uma vez nos socorremos do conhecimento do bom cinéfilo e pesquisador Antonio Nahud para falar sobre a divina e maravilhosa GARBO. No auge da fama, ela recebia, e jamais leu, quinze mil cartas de fãs por semana, muitas delas pornográficas. Em 1941, aos 36 anos, inesperadamente, abandonou o cinema e durante os seguintes 50 anos tentou que o mundo a esquecesse, numa reclusão voluntária. Foi uma tarefa impossível: considerada a mulher mais bonita do nosso planeta, GRETA GARBO era prisioneira de seu próprio mito. Durante seu retiro, poucos amigos tiveram acesso a sua intimidade. Nos tempos de glória, o visual sofisticado, com sobrancelhas e pálpebras marcadas a lápis e pó de arroz bem claro, era imitado por milhares de admiradoras.
Em 18 de setembro de 1905, em Estocolmo, na Suécia, nascia num dos mais miseráveis bairros operários da capital sueca, Greta Lovisa Gustafsson, a caçula de três filhos. Soberana nas telas em seus vestidos sofisticados, na vida real a deusa era simples, inclusive muitas vezes esnobada porque se vestia mal. Em um dos seus maiores triunfos, Grande Hotel de 1932, fala a famosa frase que a marcou pelo resto de sua vida: “I want to be alone” (Desejo ficar só). O que realmente aconteceu em 1941, depois de “Duas Vezes Meu”, retirando-se da carreira artística e nunca mais aparecendo publicamente. Contestando essa frase mítica, numa de suas raras entrevistas, GARBO declarou que “Nunca disse “Desejo ficar só”. Eu apenas disse “Quero ser deixada em paz”. Existe uma grande diferença”.
Indicada quatro vezes ao Oscar de Melhor atriz (“Anna Christie”, “Romance”, “A Dama das Camélias” e “Ninotchka”), jamais chegou a ganhá-lo, o que para ela tinha pouca importância. Em 1954 recebeu um Oscar Especial pelo conjunto da obra. Como era de se esperar, não compareceu à cerimônia para receber a estatueta, cabendo a Nancy Kelly receber o prêmio por ela. Em 1953, comprou um apartamento com sete quartos em Nova Iorque, na Rua 52, nº 450, com vista para o East River, onde passou o resto da vida. A moradia era luxuosamente decorada, com móveis do século XVIII e obras de arte, mas sem qualquer fotografia ou jarro de flores. Ocasionalmente era vista caminhando pelas ruas com roupas simplórias e enormes óculos de sol, sempre evitando a todo custo olhares curiosos, paparazzis e chamar qualquer tipo de atenção. Um dos seus prazeres secretos era escolher um estranho nas ruas e segui-lo discretamente durante horas.
De personalidade forte, entre a luz e as trevas. Era possessiva, narcisista e sofria longos períodos de depressão. Complexa e excêntrica, solitária e majestosa, construiu sua carreira sem escândalos, com firmeza e elegância. Belíssima, altiva, distante, glacial, enigmática, irônica, culta e com senso de humor: entre o encanto ambíguo e a sensualidade, a indiferença e a androginia. Sonhava em desempenhar papéis masculinos – Dorian Gray, Hamlet e São Francisco de Assis – e lutou por isso, mas a Metro-Goldwyn-Mayer (MGM) considerava tal pretensão absurda. Ela não gostava do seu primeiro nome, GRETA, e não respondia quando era chamada por ele. Sim, essa aí foi Greta Garbo...
A pesquisadora de teatro e cinema Danielle Crepaldi nos descreve a maestria com que Hollywood tomou a desajeitada mocinha sueca e transformou-a na sinopse da sedução e do mistério é digna de nota. A imagem da mulher inatingível que Greta mantinha na imprensa, ao fugir das câmeras, viajar e hospedar-se sob pseudônimos e se recusar a dar entrevistas, encontrava seu eco nas personagens que desempenhava. Greta Garbo, a bela, esquiva, sedutora e andrógina Miss Garbo, que raramente era premiada com o amor de seus pares românticos ao final de seus filmes, e que, curiosamente (ou não), viveu, durante toda sua existência, uma vida amorosa complicada e dúbia.
há algo de sádico que circunda a criação de Greta Garbo e de tantos outros astros e estrelas fabricados pela indústria cinematográfica, especialmente aqueles encarregados de tipos exóticos. Esta grande atriz, de uma intensidade dramática ímpar, temia envelhecer e, assim, perder aquilo que mantinha em pé sua imagem de deusa, imagem sem a qual a Hollywood daqueles tempos supunha não poder viver. No entanto, infelizmente sua maturidade como atriz chegou juntamente com o desgaste do tipo que lhe foi criado, e ela se viu obrigada a abandonar as telas aos 36 anos.
Greta viveu mais quase 50 anos, todos eles para negar o “EU” que seus filmes lhe imprimiram. Essa fotografia, logo abaixo, é a prova disso. Aliás, a última fotografia de Greta Garbo do ano de 1990. Aí está ela, aos 84 anos, flagrada antes da última visita que faria ao hospital, de onde não mais sairia. Em 15 de abril de 1990 morreu em Nova York, Greta Lovisa Gustafsson, a "ESFINGE SUECA" que se aposentou do mundo do cinema com apenas 36 anos, quando era a atriz mais bem paga de Hollywood, para fugir de uma vida pública que, segundo muitos, sempre a aborreceu.