Uma das mais tradicionais confrarias religiosas da Espanha prepara as celebrações de Semana Santa sob uma grande polêmica. A procissão do sábado de aleluia contará com uma escultura em que Jesus Cristo aparece nu.
A imagem em madeira chamada Cristo em braços da morte foi feita sob encomenda da prefeitura de Medina del Campo (centro-leste espanhol) e, muito antes de sair às ruas, já recebeu críticas e elogios de fiéis, políticos, artistas e religiosos.
A peça que mede 2,45 metros de altura está sendo exibida ao público no Museu da Cidade, de onde sairá no próximo dia 9 de abril em procissão.
O escultor espanhol Ricardo Flecha, autor da escultura, entende a polêmica, mas afirma que a intenção foi apenas voltar a uma interpretação barroca da Via Cruxis.
“Me entristece que o aspecto sexual seja o mais importante aqui, porque frivoliza o meu trabalho”, disse o artista à BBC Brasil. “Tem muito mais valor o conceito de um Cristo entregue nos braços da morte que o fato de estar nu.”
Flecha explicou ainda que queria voltar ao passado com a obra. “No século 16, tínhamos imagens realistas de Cristos que se rebelavam contra a morte e virgens que quase blasfemavam. No meu caso, a nudez só representa o desamparo e a fragilidade.”
Sensibilidade dos fiéis
Mas a proposta não parece ter convencido todos os fiéis que saem em procissão nas 12 confrarias da cidade.
Depois de receber críticas de religiosos e políticos locais, a prefeitura ainda não decidiu se a imagem será levada às ruas do jeito em que está ou se os genitais estarão cobertos por um tecido. Por via das dúvidas, o escultor já recebeu a encomenda de preparar uma peça de cobertura.
Um dos mais críticos é o vice-presidente da Junta Local de Semana Santa de Medina, David Muriel Alonso, que acha que a imagem fere a sensibilidade de fiéis e foge ao habitual decoro da celebração católica.
“É possível ser realista sem a necessidade de tanta exposição. Mostrar os genitais do Nosso Senhor é realmente imprescindível? Entendemos as procissões como momentos de recolhimento, de profunda sensibilidade. É tão difícil respeitar isso?”, questionou à BBC Brasil.
“É verdade que há séculos os artistas já faziam obras de arte de figuras sacras nuas. Não há nada de errado nem de irreverente nisso. Acontece que o Concílio de Trento (1545-1563) provocou um forte puritanismo e as peças passaram a apresentar-se vestidas”, diz.
“Agora, o que uns veem como escândalo e ferimento de sensibilidades outros veem como seguimento de uma escola acadêmica determinada, uma obra de arte. Mas é preciso considerar todos os pontos de vista e chegar a um acordo. Se os fiéis vão se sentir mal pelo nudismo, o cobriremos e ponto. Depois da procissão, tiramos o pano”, concluiu.
Fonte BBC Brasil
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