Foto do portal G1 |
Heitor Scalambrini Costa
Professor da Universidade Federal de Pernambuco
Há 23 anos, a cidade de Itacuruba na caatinga pernambucana foi inundada pelas águas do Rio São Francisco para a construção da barragem de Itaparica. Os moradores foram transferidos para a nova Itacuruba, uma espécie de cidade cenográfica a cerca de 481 km de Recife, com uma população de pouco mais de 4 mil habitantes, vivendo quase que exclusivamente dos empregos que a Prefeitura oferece. Na área rural plantam para sobreviver feijão, cebola, tomate e melancia.
A Itacuruba de hoje se encontra situada no Sertão do Moxotó de Pernambuco, no sub-médio São Francisco na micro-região de Itaparica.
Minha visita a Itacuruba se deu em função da proposta de instalação de uma usina nuclear naquela região, e o interesse em conhecer o local, seu povo, sua gente, e o que pensam de tal empreendimento. Nesta oportunidade o que também me chamou a atenção foi a promessa de a cidade abrigar um centro de pesquisas astronômicas.
No papel é um projeto ambicioso proposto para ser um verdadeiro diferencial do segmento turístico-científico, e no desenvolvimento da astronomia no nordeste. A promessa seria tornar a cidade uma referência no turismo pedagógico, atraindo alunos e professores de vários estados, e dinamizando sua economia. O local escolhido fica a oito quilômetros da cidade, no Morro da Serrinha, em uma área de 5 ha. O acesso é por meio de uma estrada não asfaltada, que se encontra extremamente prejudicada pelo processo de erosão em vários trechos. Não há sinalização que oriente o visitante até o local, o que tornou necessário a ajuda de um nativo da cidade para ser nosso guia.
O estudo sobre a cidade abrigar um centro de estudos astronômicos ocorreu por iniciativa do Observatório Nacional (ON), e começou a ser desenvolvido em 1996. A escolha de Itacuruba foi pelos baixos índices pluviométricos que apresenta, pela pouca poluição luminosa noturna, e pela excelente transparência do ar. Também está planejado o observatório solar, e a instalação do telescópio magnético, este subordinado à Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).
O que verificamos nesta visita é uma situação bem diferente do que é propagandeado e anunciado na mídia. Existe atualmente no local duas construções, espaçadas e não muito distantes entre si (uns 500 metros), completamente abandonadas, cujas obras estão interrompidas desde 2008. Uma situada na parte mais alta, com uma visão panorâmica sobre toda região, aparentando ser o local para abrigar o telescópio principal, cujo prédio foi construído em uma base sólida que compreende o lajedo natural da serra. Já a outra construção situa-se na entrada da área, aparentando ser uma edificação destinada ao acolhimento dos visitantes. Quando de minha visita em 27/8/2011, as estruturas de alvenaria de ambas as construções necessitavam de manutenção, e contavam com vegetação crescente nos seus entornos e nos interiores.
Em outro local totalmente cercado, dentro desta área maior está localizado o OAA e uma construção de apoio. O projeto do ON, cujo nome formal é IMPACTON (Iniciativa de Mapeamento e Pesquisa de Asteróides nas Cercanias da Terra do Observatório Nacional) está em funcionamento desde o inicio deste ano. Não é aberto a leigos, nem a turistas, já que se trata de uma construção destinada à pesquisa cientifica.
Com a construção do OAA, avalia-se a trajetória de asteróides e cometas que possam atingir a superfície da Terra, e integra o Programa Internacional de Observação e Monitoramento de Quedas. Este telescópio permite que os astrônomos digitem a posição do céu que querem olhar no teclado do computador, é automaticamente o telescópio é direcionado. Faz imagens daquele ponto, e em pouco tempo o cientista recebe o resultado na tela do computador. Seu trabalho é estudar aquilo que o telescópio enxergou no espaço. Essa nova forma de observação permite, por exemplo, que um astrônomo que esteja no Rio de Janeiro possa enviar seu pedido ao centro de observação de Itacuruba sem estar lá. A ordem vai pelo computador e a resposta também vem por ele.
Mesmo com as obras do complexo astronômico paralisadas desde 2008, já nesta época as autoridades municipais e estaduais anunciavam que estavam praticamente prontas, restando apenas alguns detalhes para abrir totalmente à visitação pública. Em 5/2/2011 o governador do Estado esteve em Itacuruba, com toda pompa, e com a população nas ruas assinou convênios e deu ordem de serviços para diversas obras, inclusive prometendo (mais uma vez) apoio ao projeto do observatório. Também em recente reportagem no DP de 27/3/2011, novamente promessas foram requentadas, sendo agora afirmado pelos gestores públicos que a conclusão das obras deve ocorrer até dezembro de 2012.
Mais uma vez se repetem as promessas dos governantes (semelhante a que está sendo feito para justificar e obter o apoio da população para a construção da usina nuclear) com as palavras mágicas de trazer o progresso para a região, gerar emprego e renda. Ilude-se toda uma população já tão sacrificada, desestimulada e depressiva, como se constatou em recente trabalho investigativo do jornalista Eduardo Machado publicado no Jornal do Comercio intitulado “Itacuruba: a terra dos deprimidos” (JC 21/08/2011), desnudando a real situação do município, onde mais de 1/3 da população adulta toma medicamentos psicotrópicos para amenizar a depressão, e onde o número de suicídios na cidade ultrapassa em 4 vezes a média nacional.
A decepção e frustração por promessas não cumpridas são grandes, e lamentavelmente usadas como instrumento de marketing político dos governos municipal, estadual e federal. Não só a população local, mas também os cidadãos e as cidadãs deste Estado estão indignados com as obras inacabadas que se arrastam indefinidamente, como a do Observatório de Itacuruba.
Professor da Universidade Federal de Pernambuco
Há 23 anos, a cidade de Itacuruba na caatinga pernambucana foi inundada pelas águas do Rio São Francisco para a construção da barragem de Itaparica. Os moradores foram transferidos para a nova Itacuruba, uma espécie de cidade cenográfica a cerca de 481 km de Recife, com uma população de pouco mais de 4 mil habitantes, vivendo quase que exclusivamente dos empregos que a Prefeitura oferece. Na área rural plantam para sobreviver feijão, cebola, tomate e melancia.
A Itacuruba de hoje se encontra situada no Sertão do Moxotó de Pernambuco, no sub-médio São Francisco na micro-região de Itaparica.
Minha visita a Itacuruba se deu em função da proposta de instalação de uma usina nuclear naquela região, e o interesse em conhecer o local, seu povo, sua gente, e o que pensam de tal empreendimento. Nesta oportunidade o que também me chamou a atenção foi a promessa de a cidade abrigar um centro de pesquisas astronômicas.
No papel é um projeto ambicioso proposto para ser um verdadeiro diferencial do segmento turístico-científico, e no desenvolvimento da astronomia no nordeste. A promessa seria tornar a cidade uma referência no turismo pedagógico, atraindo alunos e professores de vários estados, e dinamizando sua economia. O local escolhido fica a oito quilômetros da cidade, no Morro da Serrinha, em uma área de 5 ha. O acesso é por meio de uma estrada não asfaltada, que se encontra extremamente prejudicada pelo processo de erosão em vários trechos. Não há sinalização que oriente o visitante até o local, o que tornou necessário a ajuda de um nativo da cidade para ser nosso guia.
O estudo sobre a cidade abrigar um centro de estudos astronômicos ocorreu por iniciativa do Observatório Nacional (ON), e começou a ser desenvolvido em 1996. A escolha de Itacuruba foi pelos baixos índices pluviométricos que apresenta, pela pouca poluição luminosa noturna, e pela excelente transparência do ar. Também está planejado o observatório solar, e a instalação do telescópio magnético, este subordinado à Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).
O que verificamos nesta visita é uma situação bem diferente do que é propagandeado e anunciado na mídia. Existe atualmente no local duas construções, espaçadas e não muito distantes entre si (uns 500 metros), completamente abandonadas, cujas obras estão interrompidas desde 2008. Uma situada na parte mais alta, com uma visão panorâmica sobre toda região, aparentando ser o local para abrigar o telescópio principal, cujo prédio foi construído em uma base sólida que compreende o lajedo natural da serra. Já a outra construção situa-se na entrada da área, aparentando ser uma edificação destinada ao acolhimento dos visitantes. Quando de minha visita em 27/8/2011, as estruturas de alvenaria de ambas as construções necessitavam de manutenção, e contavam com vegetação crescente nos seus entornos e nos interiores.
Em outro local totalmente cercado, dentro desta área maior está localizado o OAA e uma construção de apoio. O projeto do ON, cujo nome formal é IMPACTON (Iniciativa de Mapeamento e Pesquisa de Asteróides nas Cercanias da Terra do Observatório Nacional) está em funcionamento desde o inicio deste ano. Não é aberto a leigos, nem a turistas, já que se trata de uma construção destinada à pesquisa cientifica.
Com a construção do OAA, avalia-se a trajetória de asteróides e cometas que possam atingir a superfície da Terra, e integra o Programa Internacional de Observação e Monitoramento de Quedas. Este telescópio permite que os astrônomos digitem a posição do céu que querem olhar no teclado do computador, é automaticamente o telescópio é direcionado. Faz imagens daquele ponto, e em pouco tempo o cientista recebe o resultado na tela do computador. Seu trabalho é estudar aquilo que o telescópio enxergou no espaço. Essa nova forma de observação permite, por exemplo, que um astrônomo que esteja no Rio de Janeiro possa enviar seu pedido ao centro de observação de Itacuruba sem estar lá. A ordem vai pelo computador e a resposta também vem por ele.
Mesmo com as obras do complexo astronômico paralisadas desde 2008, já nesta época as autoridades municipais e estaduais anunciavam que estavam praticamente prontas, restando apenas alguns detalhes para abrir totalmente à visitação pública. Em 5/2/2011 o governador do Estado esteve em Itacuruba, com toda pompa, e com a população nas ruas assinou convênios e deu ordem de serviços para diversas obras, inclusive prometendo (mais uma vez) apoio ao projeto do observatório. Também em recente reportagem no DP de 27/3/2011, novamente promessas foram requentadas, sendo agora afirmado pelos gestores públicos que a conclusão das obras deve ocorrer até dezembro de 2012.
Mais uma vez se repetem as promessas dos governantes (semelhante a que está sendo feito para justificar e obter o apoio da população para a construção da usina nuclear) com as palavras mágicas de trazer o progresso para a região, gerar emprego e renda. Ilude-se toda uma população já tão sacrificada, desestimulada e depressiva, como se constatou em recente trabalho investigativo do jornalista Eduardo Machado publicado no Jornal do Comercio intitulado “Itacuruba: a terra dos deprimidos” (JC 21/08/2011), desnudando a real situação do município, onde mais de 1/3 da população adulta toma medicamentos psicotrópicos para amenizar a depressão, e onde o número de suicídios na cidade ultrapassa em 4 vezes a média nacional.
A decepção e frustração por promessas não cumpridas são grandes, e lamentavelmente usadas como instrumento de marketing político dos governos municipal, estadual e federal. Não só a população local, mas também os cidadãos e as cidadãs deste Estado estão indignados com as obras inacabadas que se arrastam indefinidamente, como a do Observatório de Itacuruba.
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